sexta-feira, 31 de julho de 2015

Grilos (ou Da Janela II)

Eu tinha um rádio relógio.
E eu tinha você, certo?

A gente costumava ouvir Guarani nas madrugadas, contentes.
Sentados, ali, na janela,
Beber, musicar, nos amar e tudo mais
Faziam a cidade mais bela lá, do alto do Cidade,
Observando, dali, o céu das Gerais
E todos aqueles estranhos sinais.

É mesmo incerto o destino da gente - insistente! - apesar da idade.

Fato é que eu tinha o tal rádio relógio,
E botava ele pra me acordar quando você não estava por perto...

Ele quebrou quando você partiu.

quarta-feira, 29 de julho de 2015

40 day dream

E então eu, tantas vezes musa
Logo eu, inúmeras vezes incansavelmente superior
Penso, agora, não merecer o seu amor

Na verdade, confusa
Por este querer absurdo
Acredito e me iludo ao sentir seu calor

O quero, contudo
E, mais que tudo, proponho
Fazer do sonho a realidade
Você ser meu com vontade

quinta-feira, 23 de julho de 2015

Dois (ou 19 de Julho)

Topei com ele duas vezes
Por duas vezes deixei escapar
Como andasse sempre atrasada
Não soube quando e o que falar

Eu que nunca sei o que falar
(E falo sem parar)
Erro sempre a hora de calar
Me falta ar

Vivi o que sonhei uns meses
Alguns desses eu não vi passar
Feito uma doida desvairada
Experimentei o tal do amar

Por duas vezes me pus a revirar
Sorri sozinha relembrando
Passei alguns dias cantando
Me permiti voar
Não quis prender ninguém numa gaiola
Enjaulei, então, minhas palavras
Os meus sentimentos calei
Por medo de perder a hora
Me adiantei em vão
E a paixão atropelei

Duas vezes achei e me perdi
Os dois não

quarta-feira, 15 de julho de 2015

Pontual

E então a gente não mais se falou.

Aconteceu com ele,
Com ela, com você...

E aconteceu sem eu dar conta.

Sem eu perceber,
O nó desatou,
O laço se desfez.

Claro! Não foi a primeira vez.
Dessa vez.
De algum modo, me tocou.

Me tem (pare!) sido bom o modo como tudo ficou.

A vida seguiu,
A dança mudou.
Pude, tonta, notar meu constante atrasar...

E, sem mais, seguir, no acaso, pontual.
Tchau!

domingo, 12 de julho de 2015

Reconvexo (ou Reflexo)

Eu adoro sua boca
E seu sorriso fácil.
E quando, sorrindo, seus olhos ficam apertadinhos.
Eu adoro, em você, cada pedacinho.
Adoro sua cicatriz no nariz
E sua barba falhada.
Adoro me imaginar sua melhor namorada.
Eu adoro a sua pele.
A cor, a textura, o sabor.
Adoro pensar merecer o seu amor.
Eu adoro seus cachinhos,
Suas sobrancelhas,
Seus dedos, suas mãos...
Adoro sentir quando bate forte seu coração.
Eu adoro sua bunda.
(Você de cueca é uma visão!)
Adoro suas pernas
E ter sua atenção.
Adoro sua voz
E todas as muitas coisas em comum.

Eu te quero como nenhum!

terça-feira, 7 de julho de 2015

Poema absurdo em linhas tortas

Eu já conheci quem tivesse levado porrada.
Eu conheci você.
Você que não tem sido campeão em tudo,
Assim como eu.

Tantas vezes reles,
Tantas vezes porco,
Tantas vezes vil,
Tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo.

Eu.

Que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho.
Que tantas vezes tenho sido ridícula, ABSURDA.
Que tenho enrolado os pés nos tapetes da ética.
Que tenho sido grotesca, mesquinha, submissa e arrogante.
Que tenho sofrido (seus) enxovalhos e calado.
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridícula ainda!

Eu, que tenho sido cômica,
Que tenho feito vergonhas financeiras,
Pedido emprestado sem pagar.

Eu, que quando a hora do soco surgiu, me tenho mantido na possibilidade do soco.
Até mesmo torcido para ser acertada.

Eu, que tenho sofrido a angustia das pequenas coisas ridículas.
Ao pensar em você.

Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo,
A não ser você.

Que, diferente de toda a gente que eu conheço e que fala comigo,
Já teve um (ou mais) ato ridículo, sofreu enxovalhos.
Você que nunca foi príncipe - todos eles sim - na vida...

Quem me dera ouvir (de novo) sua voz humana,
Que confessa pecados e infâmias.
Que me contava violências e covardias.
Que não é nem nunca será o ideal.
Que, neste largo mundo, foi capaz de me confessar que uma vez foi vil.

Ó Godot, meu irmão,
Estou farta de semideuses!

Onde é que há gente no mundo além de eu e você?

Então somos só nós os vis e errôneos nesta terra?

Podem não ter sido amados,
Podem ter sidos traídos.
Mas ridículos, só nós dois.
Ridículos sem ter sido traídos,
Não podemos falar com nossos superiores sem titubear.

Eu, que tenho sido vil, literalmente vil, no sentido mesquinho e infame da vileza,
Te imploro: Volta aqui, pra me acompanhar!

(Minha torta e absurda versão do Poema em linha reta do Pessoa)